sexta-feira, 26 de abril de 2013

Não diga a minha mãe que fiquei cego...



O prisioneiro Mohammed Khamis Brash, 33 anos, do campo de refugiados de Amari-Ramallah, perdeu os olhos e os pés na prisão israelense de Eshel, no Nakab (Neguev, em hebraico). Ele enviou uma mensagem a seu povo na qual relata sua dor, fala do sangramento de seu corpo e dos problemas enfrentados pelos palestinos nas prisões de Israel, um sofrimento sem fim.

Não diga a minha mãe que fiquei cego...


Não diga a minha mãe que fiquei cego, que ela me vê e que não a vejo. Durante as visitas, atrás das grades, eu a engano, sorrindo quando ela me mostra as fotos de meus irmãos, amigos e vizinhos. Ela não sabe que estou cego. Depois que a doença se agravou, a escuridão invadiu meus olhos e meu corpo.

Não diga a minha mãe que espero há anos uma cirurgia de transplante de córnea que a administração da prisão sempre adia, dando todo tipo de desculpas para manter meus olhos longe da claridade. Não diga a ela que os fragmentos das balas e das bombas que me atingiram ainda machucam meu corpo e o fazem sangrar, e que meu pé esquerdo foi amputado e substituído por uma prótese, enquanto o pé direito apodreceu e secou, sem vida.

Não diga a minha mãe sobre o que nós, prisioneiros, sentimos nos primeiros dias de prisão ao ver apenas grades de ferro e paredes cinzentas. Diga a ela que estou vivo e saudável, que enxergo, ando e corro, que brinco e pulo, que escrevo e leio, carregando minha dor sobre a bengala, e que vejo meu irmão mártir como se fosse uma lua iluminando o céu e se comunicando comigo sempre que a força dos relâmpagos, dos trovões e das nuvens enchem o céu.

Não diga a ela que não conheço mais o sono, que os analgésicos me anestesiam. Quando me movimento, sinto como se meu corpo batesse em ferro. Meu colega, que dorme a meu lado, levanta-se para me ajudar a chegar ao banheiro. Ficar acordado me dói e o sono não vem.

Não diga a minha mãe que uma bala de fragmentação entrou em minha nuca no dia em que sangrei nas ruas do acampamento, e que os pedaços de metal se espalharam em meu corpo e atingiram meus olhos e pés, e que antes de perder a consciência vi um garoto correr em minha direção, carregando a bandeira palestina e gritando “Mártir, mártir”...

Diga a minha mãe que meu sonho pode não ser suficiente, mas que o imenso carinho que tenho por ela jamais me abandonará. Diga-lhe que não sei se volto ou não para casa, mas que ela deixe a porta aberta, mantendo em seu coração a esperança do dia de amanhã.

Não diga a minha mãe que Israel, em pleno século XXI, transformou prisões em lugares nos quais se plantam doenças que dissolvem os corpos lentamente, e que as cadeias se transformaram em laboratórios de experiências testadas em pessoas vivas, tornadas cobaias cuja morte não tarda.

Não diga a ela que já memorizei todos os nomes das doenças, dos medicamentos e dos vários tipos de analgésicos que tomo, e que há muito tempo vejo meu amigo Zakaria Issa em coma.

Não diga a minha mãe sobre os presos doentes, sobre o fato de as enfermidades se espalharem rapidamente por seus corpos: Ahmad Abu al-Rub, Khaled Shawish, Ahmed al-Najjar, Mansour Mouqada, Akram Mansour, Ahmad Samara, Wafaa Albes, Rima Daraghmeh, Tarek Assi, Mutassim Raddad, Riad El-Amour, Yasser Nazzal , Ashraf Abu Darii, Jihad Abu Haniya. A prisão e a doença os matam lentamente. O descaso de Israel leva os prisioneiros à morte.

Diga a ela que precisarei atravessar três portões de ferro no dia em que for para casa, mas que me sinto perto dela quando ouço o bater das asas de um pássaro, ou quando a saudade faz as lágrimas arderem em meus olhos, quando os fragmentos das balas me beliscam as costelas, quando faço as cinco orações diárias. Que Allah nos liberte das prisões e encha nossos corações de paciência e força.

4 comentários:

  1. Não tenho como não sentir ódio do Estado de Israel, assim como os Judeus sentia ódio da Alemanha Nazista. Eles aprenderam muito bem com os seus carrascos.

    Minha solidariedade ao Povo Palestino!

    Que Deus tenha pena e vergonha da espécie que criou.

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  2. Minha solidariedade ao Povo Palestino!
    que Deus conforte o coração desse homem .

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  3. Tem muita gente preocupada com cães e gatos, nada contra os bichos, mas ninguém se posiciona contra Israel. Fica a apergunta: " Por que as Nações Unidas não criam o Estado da Palestina como criou o Estado de Israel?

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  4. Meu irmão mártir seria um homem bomba?

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